LINGUAGEM MÉDICA
 

MORBIDADE, MORBILIDADE

        Os dois termos acima têm sido utilizados com o mesmo significado e com duas acepções: 1. Capacidade de produzir doença. 2. Número de casos de uma doença em um grupo populacional[1]. Nesta segunda acepção constitui um índice epidemiológico, o índice de morbidade, que se desdobra nos coeficientes de incidência e de prevalência.[2]
        Estamos diante de duas formas paralelas para designar o mesmo fato. Qual seria a forma preferível? Ambas provêm da palavra latina morbus, i, que significa tanto doença física, enfermidade, como doença do espírito, paixão.[3] De morbus + diminutivo illus formou-se morbillus, i, nome primitivo da varíola e que passou a designar sarampo. De morbilli deriva morbiliforme em português, que quer dizer com o aspecto de sarampo, semelhante ao sarampo.
        Dentre os cognatos de morbus em latim está o adjetivo morbidus, a, um, que corresponde a mórbido em português.
        Parece óbvio que o vocábulo formado com a raiz morbi e o sufixo -dade em português só poderia ser morbidade. A introdução da sílaba li faz lembrar morbilli, relativo ao sarampo.
        Entretanto, uma coisa é a lógica e outra os fatos da língua. Talvez a forma com o acréscimo da sílaba li, morbilidade, tenha surgido por analogia com mortalidade, uma vez que ambos os termos andam sempre juntos. Ou tratar-se-ia de um recurso eufônico?
        Em italiano usa-se morbilità e em espanhol morbilidad ou morbididad. Em inglês encontramos morbidity e morbility, este último termo pouco usado. Do mesmo modo, em alemão temos morbididät e morbilität. Em francês prevaleceu morbidité. Em português devemos optar entre morbidade e morbilidade.
        Conforme ressaltou Plácido Barbosa, "morbidade é de formação mais conforme à estrutura do étimo morbidus, no qual não existe l".[4]
        Os nossos léxicos titubeiam entre uma e outra forma. Averbam somente morbidade Pedro Pinto, [5] Antenor Nascentes [6] e Aurélio Ferreira,[1]; abonam apenas morbilidade Silveira Bueno [7] e Aulete-Garcia,[8]; aceitam as duas formas Cândido de Figueiredo [9], Prado e Silva [10] e o Vocabulário Ortográfico da Academia Brasileira de Letras. [11] Rey, em seu Dicionário de termos técnicos de medicina e saúde considera sinônimos os dois termos e registra morbilidade com remissão para morbidade, o que pressupõe preferência por esta forma.
        O Glossário de Epidemiologia, publicado como suplemento dos Arquivos da Faculdade de Higiene e Saúde Pública da Universidade de São Paulo, registra apenas morbidade,[12], que me parece a forma que deve prevalecer.
 

Referências bibliográficas

1. FERREIRA, A.B.H -  Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro, Ed. Nova Fronteira, 1975.
2. ROUQUAYROL, M.Z. - Epidemiologia e Saúde, 2.ed., Rio de Janeiro, Medsi, 1986.
3. SARAIVA, F.R.S.- Novíssimo Dicionario latino-português, 10. ed., Rio de Janeiro, Livraria Garnier, 1993.
4. BARBOSA, P.- Dicionário de terminologia médica portuguesa. Rio de Janeiro, Liv. Francisco Alves, 1917.
5. PINTO, PA.- Dicionário de termos médicos, 8. ed. Rio de Janeiro, Ed. Científica, 1962.
6. NASCENTES, A.- Dicionario etimológico resumido. Rio de Janeiro, INL, 1966.
7. DICIONÁRIO BRASILEIRO MELHORAMENTOS (GRANDE), 8.ed. São Paulo, 1975.
8. ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS: Vocabulário ortográfico da língua portuguesa, 3. ed. Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1999.
9. REY, L.- Dicionário de termos técnicos de medicina e saúde. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan S.A., 1999.
10. SCHMID, A.W., Arq. Fac. Higiene e Saúde Pública Univ. São Paulo 10:1-10, 1956  


Publicado no livro Linguagem Médica, 3a. ed., Goiânia, AB Editora e Distribuidora de Livros Ltda, 2004..  

Joffre M de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás
Membro da Sociedade Brasileira de História da Medicina
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br

10/9/2004.