LINGUAGEM MÉDICA
 

SHIGELLOSE, SHIGELOSE, SHIGUELOSE, XIGUELOSE

        O agente etiológico da disenteria bacilar foi descoberto em 1898 pelo bacteriologista japonês Kiyoshi Shiga, que o denominou Bacillus dysenteriae. Três anos depois, Chester propôs o nome de Bacillus shigae, em homenagem ao seu descobridor. Finalmente, em 1919, Castellani e Chalmers propuseram a criação de um novo gênero, que recebeu o nome de Shigella, compreendendo quatro subgrupos: S. enteriae, S. flexneri, S. boydii e S. sonnei.[1]
        A infecção produzida por qualquer das espécies integrantes do gênero Shigella passou a ser chamada de shigellosis em inglês; shigellosen, em alemão; shigellose, em francês; shigellosi, em italiano, e shigelosis, em espanhol. Em português, esta palavra tem sido escrita de diferentes maneiras: shigellose, shigelose, shiguelose, xiguelose. Em todas elas o sufixo ose permanece invariável, divergindo a grafia no tocante ao radical.
        Shigellose mantém o duplo l de Shigella, enquanto shigelose utiliza um único l conforme o português moderno. Na forma shiguelose o radical se encontra alterado pela introdução da vogal u, intercalada com a finalidade de caracterizar o som velar da letra g. Xiguelose é produto de um foneticismo exagerado, que considera o dígrafo sh impróprio à língua portuguesa.
        Qual das formas devemos preferir?
        A ortografia simplificada, em uso no Brasil desde 1943, permite até certo ponto uma escrita fonética, suprimindo consoantes dobradas, substituindo o y por i e eliminando os grupos consonantais ph, th, rh. Não vai ao exagero, entretanto, de descaracterizar graficamente as palavras como querem alguns reformistas radicais.
        As palavras existem como sons na linguagem falada, porém, na linguagem escrita, existem principalmente como imagens visuais. É importante que se não incorra no erro de querer modificar, consoante a fonética, todas as palavras de origem estrangeira, quando se trata de linguagem técnica. O problema se assemelha ao dos topônimos e antropônimos.
        No caso em tela, é importante a manutenção do radical Shig, que nos traz à memória, imediatamente, o nome do genial pesquisador japonês Shiga. Na forma Xiguelose este radical acha-se totalmente desfigurado.
        Assim, a forma mais próxima da nomenclatura internacional e que atende as peculiaridades da língua portuguesa é shiguelose, com um único l e a introdução da vogal u para a caracterização do som velar de g.
 

Referência bibliográfica

1.  Buchanan, R.E., Gibbons, N.E. Bergey’s Manual of Determinative Bacteriology, 8.ed., Baltimore, The Williams & Wilkins, 1975  


Publicado no livro Linguagem Médica, 3a. ed., Goiânia, AB Editora e Distribuidora de Livros Ltda, 2004..  

Joffre M de Rezende
Prof. Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás
Membro da Sociedade Brasileira de História da Medicina
e-mail: pedro@jmrezende.com.br
http://www.jmrezende.com.br

10/9/2004.